O Olhar Vivo da Terra

“Há árvores que observam. Entre cascas e veios, a natureza às vezes molda um olho — como se a floresta, em seu silêncio antigo, decidisse olhar de volta. A imagem captura um desses instantes — a presença viva de algo que nos observa.”

Dizem que toda floresta tem um coração vivo. Um olhar antigo, gravado em sua entranha, que observa o passar das eras sem jamais piscar. Às vezes, esse olhar aparece encravado em um tronco — a lembrança viva de que a Terra nos vê o tempo todo.

É real. Eles habitam um espaço-tempo alternativo. Formas luminosas dançam entre as árvores. Vozes sussurram na névoa que surge do nada. Seres que nascem do encontro entre os elementais da natureza.

Os antigos contavam que, ao entardecer, a floresta se move sutilmente, como se cada folha respirasse com consciência. E quem percebe o olho em alguma árvore, já foi tocado, mesmo sem saber, pelo espírito que habita tudo o que é vivo na mata.

Seria um guardião? Ou apenas a própria vida, olhando de volta, lembrando que há mundos inteiros vibrando sob nossas pegadas.

Salto dos Macacos – Parque Estadual Pico do Marumbi

A trilha do Salto dos Macacos está localizada na região de Morretes, dentro do Parque Estadual Pico do Marumbi, no estado do Paraná. O acesso é feito pela histórica estrada Caminho do Itupava, até o posto do IAP em Porto de Cima, a cerca de 11 km do centro de Morretes.

A entrada no parque é gratuita, mas é necessário realizar um cadastro no posto e iniciar a trilha até às 9h, com retorno obrigatório até às 14h. Isso porque, no início do percurso, há duas travessias pelo rio Nhundiaquara, que podem se tornar perigosas em caso de cabeças d’água. Em dias com previsão de chuva, o acesso pode ser fechado sem aviso prévio por motivos de segurança.

A trilha começa com uma caminhada de aproximadamente 250 metros pela estrada, seguida pela primeira travessia do rio Nhundiaquara. A partir daí, o trajeto se torna mais desafiador e imersivo, subindo a Serra do Mar paranaense com um ganho de altitude de 300 metros – apesar disso, não apresenta grandes dificuldades técnicas.

O caminho segue por dentro da mata atlântica, passando por trechos de atoleiros, riachos e, ocasionalmente, obstáculos como árvores caídas. Após cerca de 3 horas de caminhada, o final da trilha desce em direção ao leito rochoso do rio dos Macacos.

O ponto alto do passeio são as piscinas naturais de águas cristalinas, perfeitas para um mergulho revigorante. A surpresa fica por conta do Salto dos Macacos, escondido entre as sombras da mata, inacessível devido ao terreno escarpado e escorregadio. Já a impressionante queda abrupta do rio oferece uma vista deslumbrante do Conjunto Marumbi.

O Canto da Floresta

Era manhã de primavera e a floresta despertara lentamente sob uma névoa suave, úmida, impregnada de aromas florais e terrais, sobre os primeiros raios de sol, um espetáculo de luz e sombra. Era uma sensação estranha, a floresta estava mais íntima. Fechei os olhos e respirei profundamente. Senti a névoa dançar ao redor, sob um manto de encanto e mistério. Um lembrete de que a vida fervilhava em cada canto.

Algo diferente pairava no ar. Pela secura do tempo, o caminho estava coberto de folhas e raízes. Da terra brotava uma energia preguiçosa. As serpentes deslizavam silenciosamente sobre as folhas secas, enquanto que os roedores espreitavam astutamente sobre os arbustos. As flores começaram a desabrochar, ainda acanhadas dentro da selva escura, e ao apurar o olhar, os insetos dançavam sobre as folhas.

Uma verdadeira sinfonia agitava a floresta, os pássaros pareciam compartilhar alegrias e segredos. Estavam todos por ali, apesar que mal conseguia avistá-los. Desta vez não haviam pássaros coloridos exibindo suas plumagens. O canto era consistente, obstinado e requintado. Era como se cada canto fosse uma celebração a vida. Naquele dia a floresta amplificou todos sons e nos presenteou com a magia da primavera.

Campo Encantado

Há muito tempo, numa longínqua dimensão, onde a brisa dança sobre campos de cores sonoras, a Jozefinha, uma abelha jovem e solitária, embarcou em uma jornada inesperada. Era uma criatura pequena, ainda uma novata na arte de voar, mas com o coração repleto de coragem e curiosidade.

Como sempre, enquanto voava pelo firmamento, Jozefinha se viu desviando de seu caminho habitual. Uma leve brisa a conduziu por entre os raios dourados do sol, guiando-a para um mar de Girassóis. Maravilhada com a visão, mergulhou em espiral, dançando entre as altas hastes dos Girassóis.

O seu zumbido ecoava com destemor. Explorava cada recanto naquele campo encantado. À medida que voava, os Girassóis despertaram como que saindo de um sono profundo, virando-se suavemente em sua direção. Todos estavam encantados e curiosos com aquela bagunceira barulhenta.

A jovenzinha estava envolta numa aura mágica, sentiu-se acolhida e amada. Nunca antes se sentira especial e parte do mundo. Ela sabia, naquele momento, que sua jornada solitária não era em vão, mas sim uma viagem para descobrir a beleza que habita nos cantos mais inesperados do orbe.

E assim, Jozefinha continuou seu trajeto, levando consigo as memórias áureas daquele campo magnetizado, de Girassóis surpreendidos por uma criaturinha que inspirou admiração e encanto pela pureza e formosura.

João-velho

É tido como um dos mais belos pica-paus do Brasil. Destaca-se pelo vistoso topete amarelo que dá origem à maior parte dos nomes populares, como cabeça-de-velho, joão-velho, pica-pau-velho, pica-pau-de-cabeça-amarela, pica-pau-cabeça-de-fogo, pica-pau-loiro e ipecuati (tupi).

Nome científico: Celeus flavescens.

Suas asas são pretas e barradas de branco com as partes inferiores pretas. O macho apresenta uma faixa vermelha nas laterais da cabeça, próximo a base do bico. Possui língua longa, preenchida de pontas em forma de escova, apropriada para extrair suco das frutas e o néctar das flores.

Alimenta-se de frutas, insetos, larvas, formigas e cupins. Na região sudeste, em Mata Atlântica, foi confirmado aves tomando o néctar das flores de duas espécies de plantas (Bombacaceae e Marcgraviaceae) do dossel da floresta.

Os pica-paus são polinizadores, pois ao visitarem várias flores das plantas, encostam a cabeça e o pescoço nas anteras e estigmas das flores. São aves benéficas na conservação da natureza, visto que se alimentam de cupins, formigas e outros insetos nocivos à madeira.

Estas aves estão sob ameaça por causa da alteração do seu habitat natural, desmatamentos e queimadas. A espécie depende de arvores altas e ocas para abrigo e construção de seus ninhos. Estão na lista de animais ameaçados de extinção do Ministério do Meio Ambiente.

Folha Caída

No desabrochar da primavera, todas as folhas revelam uma só tonalidade, mas ao longo da passagem, no intricado caminho da vida, a senda se desvanece entre folhas amarelas e secas do tempo.

Cada passo deixa sua marca, e as lembranças se entrelaçam como folhas que caem suavemente, narrando a história de uma jornada vivida com ardor e profundidade, em meio a uma dança sutil entre a luz e a sombra.

Ancorada nos valores da sua essência, as folhas caídas na água, dançam em harmonia, se dissolvem e buscam uma nova transformação, neste contínuo ciclo da vida.

O Ipê Amarelo – Caminhar é Preciso

Assim como nas estações do ano, na jornada terrena os ciclos se renovam infinitamente, do nível microscópico aos seres que habitam esse orbe.

Igual a flor do Ipê que desabrocha em vibrante tom amarelo e depois se precipita no ar, é como uma alegoria da contínua evolução na efemeridade e finitude da vida.

Mesmo que nas tormentas o tronco se incline, as raízes profundas do Ipê sustentam sua copa. Assim como nossos ancestrais, nos deram a base para crescer.

No alto da folhagem do Ipê, nem tudo que vemos é colorido, mas temos a exatidão do respeito em memória aos ancestrais e do cuidado a família e amigos.

Ainda assim, na sombra do Ipê é preciso meditar. Na labuta entre o áureo e o índigo, como é importante valorizar cada momento e ser grato a tudo e a todos.

Afinal, uma chuva de flores amarelas se espalha por toda terra, impermanente e plena na essência, e no exercício do aprender e ensinar para a eternidade das lembranças.

Raízes Ancestrais

Nas entranhas da montanha, as raízes brotam com força e resiliência das profundezas da terra. Em campos rochosos gritam na superfície e deixam cicatrizes únicas como testemunhas do tempo. Uma conexão profunda entre passado e presente.

As raízes, entrelaçadas com a terra, buscam sustento nas camadas abreviadas de solo. É como um ímã, uma ligação ancestral que ecoa nos caminhos daqueles que vieram antes ou passaram, mesmo que por um curto tempo, em nossa vida.  

Tanto que as árvores crescem e se manifestam ao longo do tempo, em ramificações que moldam o curso de uma jornada. Como nossos ancestrais, ao longo das gerações, o curso de uma vida se projeta nas consciências individuais e coletivas.

Um Espetáculo Efêmero da Vida

O Samurai

“ Entre todas as flores, a flor de cerejeira.

Entre todos os homens, o guerreiro. ”

Ditado japonês

Tudo começou em um passado distante onde os japoneses subiam as montanhas durante a primavera para adorar estas árvores sagradas, consideradas portadoras da alma dos deuses da montanha, pois das pétalas caídas que viajavam até os campos de arrozais, traziam alegria, paz, beleza, renovação, esperança e a percepção da efemeridade.

As flores de cerejeira (Sakura), possuem pétalas delicadas, de cor variada, branco à rosa claro e escuro, até amarelo, como também, variação de formato, quantidade e tamanho das pétalas, em centenas de espécies, e nem todas possuem fruto. Possui um aroma floral macio, sendo matéria prima para a indústria dos perfumes. São flores comestíveis e ingrediente para vários pratos e sobremesas.

Na cultura japonesa a floração da cerejeira é um espetáculo efêmero da vida. São cerca de duas semanas entre o desabrochar e o auge da beleza e força, em no máximo três dias de existência. Por isso, a cerejeira foi um símbolo na época dos samurais, comparado a curta duração das flores à breve vida dos guerreiros. Daí outro significado importante, do viver o momento presente.

A contemplação das flores de cerejeira (Hanami), é uma tradição e acontecimento nacional que se transforma em festividade, mobilizando milhões de japoneses atentos ao início da florada das cerejeiras.

Clareira Escarlate

Dentro da mata, o contraste do claro escuro assaltava a visão. Às vezes nem os raios do sol conseguiam adentrar a copa das arvores. Apesar de adaptado ao meio, naquela tarde a floresta estava um tanto quanto surreal. A cada passo custoso me embrenhava nas profundezas do jângal. Tropecei e cai dentro de uma clareira. Formava um círculo perfeito, forrada por uma gramínea e folhagens distintas em arbustos que se projetavam até o tronco das arvores na fronteira entre a clareira e a mata.

A cor esverdeada das folhas se tornaram avermelhadas. Com o sol quase a pino, toda luz era tomada pelo círculo. Era estranho e ao mesmo tempo grandioso aquela visão. Parecia uma chaga no chão da floresta, ruborizada, a flor da pele. De verdade, a sensação era de energia e paz. Caminhei até o centro e olhei ao redor. Eram como vasos sanguíneos emaranhados entre si.

Percebi meus pés pesados, presos a superfície. Senti meu coração desacelerar. Senti o sangue fluir dos pés à cabeça. Estava conectado a floresta. Como em câmera lenta, aquele momento pareceu eterno, mas no instante seguinte me vi saindo do círculo. Meu juízo dizia que tinha saído de um portal. Sorri, caminhei sem pensar, sem criticar. Subitamente cheguei em uma bifurcação. De imediato sabia em qual direção acreditar. Então, segui na caminhada.